Em entrevista exclusiva ao 247, o governador do Distrito Federal comenta o relatório final do caso Cachoeira, diz que houve uma conspiração para derrubá-lo e sinaliza que, a partir de agora, estará focado numa agenda positiva que inclui a participação de Brasília na Copa das Confederações e na Copa de 2014, assim como a ampliação de programas sociais
Gisele Federicce _247 - O documento preparado pelo deputado Odair Cunha (PT-MG) como trabalho conclusivo da CPI do Cachoeira tem um significado importante para o governo do Distrito Federal. Apontada inicialmente como um dos meios onde a organização criminosa do contraventor Carlos Cachoeira se infiltrou, a administração de Agnelo Queiroz (PT) ficou fora da lista de indiciados no texto final, que será votado na próxima quarta-feira 5. A conclusão do relator foi de que a quadrilha não conseguiu ser beneficiada no local. “Significa um divisor de águas”, resume Agnelo, que falou ao 247 na última sexta-feira. "Ficou claro que houve aqui uma tentativa de conspiração, em que a quadrilha, com infiltração em vários poderes, inclusive a imprensa, marcava a data para derrubar um governo democraticamente eleito".
Agnelo afirma que a onda de denúncias contra o governo do DF nos dois primeiros anos de seu mandato não deixou a máquina parar. “Nós trabalhamos, não deixamos paralisar em absoluto”, diz o governador. Virada a página das denúncias, ele agora pensa em 2013 e 2014, quando Brasília será palco do jogo de abertura da Copa das Confederações, entre Brasil e Japão em junho do ano que vem, e terá sete jogos na Copa do Mundo, sendo a cidade-sede que mais sediará jogos do Mundial, ao lado do Rio de Janeiro.
Os planos agora são de grandes mudanças para o Distrito Federal, cuja imagem será projetada para o mundo todo nos próximos dois anos. “Será o maior momento de projeção externa de Brasília”, declara o governador. O principal objetivo, de acordo com ele, é proporcionar infra-estrutura, desenvolvimento e melhorar os serviços públicos básicos para a população, como transporte e saúde, a fim de que a capital brasileira se torne conhecida para turistas de todos os lugares por bons índices de qualidade de vida.
Leia abaixo os principais trechos da entrevista:
247 – Qual sua leitura sobre o relatório da CPI e o que ele significa para o GDF?
Agnelo Queiroz – Significa um divisor de águas importante porque repôs a justiça, na medida em que eu sofri vários ataques de pessoas que tentaram vincular esse grupo criminoso [investigado pela Comissão Parlamentar de Inquérito] com o Distrito Federal. E no relatório da CPI ficou claríssimo que a gente era vítima, e não partícipe desse esquema.
Havia uma conspiração, na sua visão?
Havia. Esse grupo se mostrou muito poderoso, tinha uma força enorme em todos os poderes, inclusive na imprensa, a ponto de ter um senador que o representava em todas as instituições. Eles tentaram entrar em Brasília achando que o nosso governo pudesse ser igual aos outros. Mas foi o contrário. Não conseguiam meu telefone, não alcançavam os objetivos deles. Fizeram umas três tentativas, entre elas uma no DFTrans. Havia um contrato da Delta (empreiteira que mantinha fortes ligações com Cachoeira), mas feito no governo anterior, não por mim. Então a partir de um certo ponto começaram a atacar. Uma coisa orquestrada. E coincidiu com o momento em que o senador [Demóstenes Torres] pediu meu impeachment, tanto na tribuna do Senado quanto na Câmara Legislativa.
Ele chegou a te procurar, para tentar costurar um acordo?
Não. Tem diálogos que aparecem mostrando que o senador ia me ligar, mas isso nunca aconteceu.
E se acontecesse, era um senador da República procurando um governador...
Claro. Eu o receberia com a maior naturalidade, ainda mais com a reputação dele. Eu vou mentir agora e dizer que não tinha uma boa referência dele? Mas nem isso aconteceu.
Então o senhor acha que a operação acabou tendo um papel importante no seu governo?
Sem dúvidas, foi um acontecimento inexplicável. Porque além de interromper as tentativas do grupo de se infiltrar no meu governo, ainda mostrou a ligação dele com o crime no Distrito Federal. Porque muitos dos diálogos referem-se a pessoas do Distrito Federal. Tem até orientação tática: “Vamos esperar sair a matéria, depois o procurador faz a denúncia e então o senador bate”. Tinham táticas desse tipo, tudo para derrubar o governo de Brasília. Ficaram indignados porque não conseguiam indicar um gari, isso consta em conversa entre eles.
Nós inclusive criamos uma Secretaria de Transparência e tomamos muito cuidado com os contratos anteriores, chegando a auditar todos eles. E nesse processo, encontramos um da Delta, da Limpeza Urbana, em que havia muitas falhas. Passamos então a cobrar deles para cumprir tudo. O contrato tinha um dos menores valores do Brasil porque a licitação fora feita em 2007 e eles só conseguiram entrar em 2010, mas com preço de três anos atrás. Então o que eles faziam era varrer um lado da via e contar também o outro. Quando identificamos isso, passamos a cobrar efetivamente. Quanto mais cobrávamos, mais ofensividade havia para cima da gente. Mas não tínhamos como saber que os ataques eram por conta de todo esse esquema. No entanto, as degravações depois mostraram que os ataques cresciam conforme a gente apertava. Eles passaram um ano sem conseguir nada, nem botar ninguém no governo. Poderia ter acontecido, por meio de um parlamentar da minha base, mas nem isso aconteceu. Não houve exceção, não houve brecha.
Ficou esclarecido para a população que não havia infiltração da organização no seu governo?
Ficou. Claro que não na mesma proporção, porque são cem denúncias para se ter uma defesa em troca. Além de haver o discurso depois do relatório da CPI, dizendo que houve uma proteção ao meu governo. Mas isso não se sustenta porque o relatório dele (Odair Cunha) é de muita densidade e a comissão estava de posse dos meus sigilos bancário, telefone, de e-mail, de tudo. E ele incluiu o prefeito de Palmas, que é do PT, prova de que ele não teve comportamentos diferentes para quem era do PT e para quem não era.
Sua relação com o governador de Goías, Marconi Perillo (PSDB), é boa?
Sempre foi muito boa. Há fóruns do Centro-Oeste, uma novidade nessa região, que sempre foi muito desarticulada. Já fizemos quatro reuniões em um ano. Uma região próspera, que pode desenvolver muito. E estamos trabalhando juntos, levando propostas para a Presidência da República quanto à pobreza e infra-estrutura nessa área. Somos solidários pelo desenvolvimento da região. Eu, pessoalmente, não tenho problema nenhum com ele.
Como é que o senhor avalia o relatório em relação a ele?
Bom, o relator tem tudo nas mãos, mas admito que não procurei saber detalhes das denúncias. Eu acompanhei minha parte, depois da minha ida na CPI, eu acho que ficou muito claro, a sociedade viu que não tinha nada mesmo. Mas nada melhor que um relatório, porque aí não são só as provas que eu apresentei, mas que um relatório apresentou, e que está disponível para todos. Eu acho, inclusive, que se não fosse a luta política, um adversário iria até elogiar se questionando como um grupo tão poderoso, bilionário, com relações estreitas com parlamentares e empresas privadas, não entrou no Distrito Federal.
Essa onda de denúncias paralisou um pouco o governo nos dois primeiros anos?
Nós trabalhamos, não deixamos paralisar em absoluto. O que dificultou foi menos esses ataques e mais a situação caótica que eu encontrei na administração pública. Ao mesmo tempo a gente implantou uma série de projetos nas áreas de saúde, segurança pública, resíduos sólidos, habitação, desenvolvimento social. As pessoas vão começar a sentir um pouco mais para frente, mas é uma mudança radical. Estamos virando a página. Ajeitamos nosso orçamento, porque eu ficava até agora tapando os buracos, e estamos olhando para a frente.
Agora falando um pouco dos próximos eventos e principalmente de 2014, de que maneira a Copa servirá de vitrine para Brasília?
O nosso estádio está com 84% das obras concluídas, um dos mais avançados das cidades-sede e onde será a abertura da Copa das Confederações. Portanto seremos o cartão de visitas. Afinal, o Brasil vai se apresentar ao mundo através da abertura da Copa das Confederações, desde o primeiro jogo. Além disso, estamos fazendo um grande investimento na cidade na parte de mobilidade urbana, vamos ter melhorias no aeroporto, em hotelaria, nos serviços. Nós vamos receber bem o brasileiro e o turista estrangeiro, tenho certeza disso.
E a crítica de que Brasília não tem futebol, como não deixar o estádio se tornar um “elefante branco”?
Vamos mostrar que esse equipamento não é um estádio, mas uma arena multiuso importante para a cidade, para atrair shows, eventos na parte cultural, esportiva, comercial. Vai haver restaurante, teatro e lojas no estádio, que está num lugar privilegiado, com muito fácil acesso e um grande estacionamento. Ele vai ajudar no desenvolvimento econômico da cidade, ocupando Brasília aos finais de semana.
Através da Copa, vamos ter a grande oportunidade de fazer com que a capital do Brasil seja conhecida no mundo. Mostrar que não é apenas uma cidade administrativa, e sim um grande centro consumidor, com a maior renda per capita do País. Será o maior momento de projeção externa de Brasília.
E estamos fazendo também outros investimentos para a cidade. Só em mobilidade urbana, contando a ampliação do metrô mais os três corredores de ônibus, são quase R$ 3 bilhões. O VLT, apesar de não ficar pronto para 2014, é um meio de transporte muito importante para a cidade e será uma forma de revitalizar a W3 Sul.
O estádio e o transporte são elementos mais visíveis. E as transformações menos visíveis?
A Copa está servindo como um grande carro-chefe para nós desenvolvermos um ramo que consideramos vocação e que precisa ser explorado ao máximo: a área de serviços. Não é apenas um evento, mas uma base para nos dar um grande desenvolvimento econômico posterior à Copa. Estamos também fazendo um investimento gigantesco na área de saúde pública, que já vem mostrando sinais de avanços importantes, como o Hospital da Criança, que atende cinco mil crianças por mês. Não há nada no setor privado com aquela qualidade. Além do home care, que tirou do hospital pacientes crônicos que estavam internados há anos, passando a receber um atendimento em casa, direto das famílias, com risco bem menor de infecção. Apenas os pacientes crônicos que estão sendo atendidos hoje por esses sistema encheriam dois hospitais. Inauguramos também quatro UPAs (Unidade de Pronto Atendimento) no período de um ano, que são unidades intermediárias para atendimento de casos menos graves, tirando a lotação dos pronto-socorros.
Já temos sinais claros de melhoria. Eu monitoro a quantidade de pessoas que estão sendo atendidas direto do meu gabinete, com imagens em tempo real das câmeras que estão nos locais. Eu sei quantos pacientes estão internados e quem está hospitalizado por mais de 48 horas – o que não pode ocorrer num pronto-socorro. Já inauguramos 30 leitos de UTI e no final do ano vamos inaugurar mais 30. Em dois anos, estamos fazendo a mesma quantidade de leitos de UTI que foi criada em 50 anos no DF.
E o que vem sendo feito em relação a transferência de renda?
Como todas, essa área de desenvolivmento social estava com uma série de complicações. Havia quatro listas de beneficiários, cada um com suas necessidades. O resultado era gente com muitos benefícios, fazendo com que os programas fossem usados como moeda eleitoral, e gente que precisava e não tinha acesso. Nós unificamos esse cadastro com a ajuda do Ministério do Desenvolvimento Social e já incorporamos nessa lista 22 mil pessoas que estavam fora. Em Brasília, o custo de vida é mais caro, o que também foi considerado nessa distribuição de renda, assim como o número de filhos e se há portadores de deficiência na família. Estamos com um programa, que é o DF Sem Miséria, cujo objetivo é a erradicação da extrema pobreza até 2014, um dado de muita importância para a capital do País.
Como funciona a atual parceria com Cingapura para traçar um plano de desenvolvimento para o Distrito Federal?
Estamos buscando com os maiores especialistas do mundo, junto com os nossos técnicos, uma forma de crescer sem esgotar a cidade. O próprio exemplo deles já justifica a parceria. Em 30 anos, houve uma verdadeira transformação da renda per capita da cidade-país, de US$ 576 para US$ 50 mil em 2011, uma das maiores do mundo. Não temos que ter vergonha em buscar exemplos de fora, isso é provincianismo puro. Vamos buscar não só essa ajuda, mas muitas outras no mundo, como em Oslo, onde estive recentemente e há uma experiência fantástica. Não existe preconceito, nós queremos é gerar emprego e a renda futura do nosso povo. E a Universidade de Brasília pode ajudar, sendo parceira, em conjunto com outros grupos. Vamos decidir o que for melhor para a cidade, sem abrir mão de ter ajuda de quantos lugares forem necessários.
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